Vovó vigarista do David Walliams (Editora Intrínseca, 2013) é um livro infantojuvenil super divertido. O autor aposta em um texto cheio de ironias e piadas rápidas que conseguem arrancar risadas em leitores de todas as idades. Utilizando do humor, aborda temas importantes, sendo o principal deles a forma como tratamos os velhos e como vemos a velhice. Na história, um neto irá descobrir que sua avó é uma pessoa dotada de histórias, de individualidade, de desejos e que dedicar parte de seu tempo para conhecê-la melhor poderá mudar para sempre sua vida.


O texto de David Walliams começa muito bem, pois nos faz refletir sobre a maneira que tratamos e o tempo que dedicamos às pessoas mais velhas. É impossível ler a obra sem evocar lembranças de momentos que passamos com nossos avós. Por conta de fatores culturais, educacionais e do próprio conflito geracional, acabamos tornando nossos avós quase invisíveis e, às vezes, só percebemos isso no momento em que eles vão embora.

Virando a esquina, eles chegaram a Grey Close, onde ficava a casinha da vovó. Era apenas mais um de uma série de chalés pequenos e tristes, habitados principalmente por gente velha. O carro parou, e Ben lentamente virou a cabeça na direção da casa: lá estava a avó, olhando ansiosa pela janela da sala. Esperando. Esperando. Ela sempre estava à janela à espera dele.
Os pais de Ben sempre tiram a noite de sexta-feira para a própria relação, seja para irem a uma festa, um restaurante, um cinema ou assistirem ao “Dançando com as estrelas”, que é o programa de TV favorito do casal. Então, o garoto precisa ir para a casa da vó, que sempre o espera ansiosamente, enquanto para Ben a noite de sexta-feira é quase um martírio.

Ben se incomoda com tudo que tem relação com a sua avó, desde a forma como ela se veste, como ela fala e o que ela come. As reclamações sobre o que ela come são as únicas em que precisamos dar razão ao garoto, pois ela possui uma obsessão inexplicável em colocar repolho em tudo. A sensação de Ben é que qualquer coisa que ele poderia estar fazendo seria melhor que passar as sextas-feiras com a avó.

Aquela noite foi a mesma história de sempre. Vovó lhe deu sopa de repolho, seguida de torta de repolho e, de sobremesa, uma musse de repolho. Ela conseguira até achar em algum lugar um chocolate com sabor repolho.
O livro possui um texto bem dinâmico e que ganha ainda mais frescor com as ilustrações de Tony Ross. Algumas ilustrações aparecem como vinhetas que ajudam a dar mais detalhes sobre a história e que colaboram com o exagero e a caricatura propostas pelo autor. As imagens são tão engraçadas e absurdas quanto o texto.

Um outro ponto que acho interessante na obra, é que ela não tem medo de trabalhar com o quanto nós, seres humanos, somos complexos em relação ao que é considerado certo ou errado. Durante toda a história, são apresentados temas que algumas pessoas acreditam não ser indicados para crianças, como se elas vivessem em um mundo onde dor, sofrimento e crime não existissem. Todos os temas que possam ser considerados impróprios para as crianças por alguns, são tratados de forma responsável na obra e obedecem à sede inerente que as crianças possuem pelas aventuras. Tudo caminha para um final muito satisfatório. 

Na narrativa, Ben fica extremamente empolgado ao descobrir que sua avó, pessoa que até então ele definia como “chata”, pode possuir um grande segredo, uma vida dupla. E não é um segredo qualquer. Ele embarca em uma investigação sobre a rotina de sua avó e ao que tudo indica, ela pode ser uma grande vigarista.