Variações enigma do André Aciman (Intrínseca, 2018) é um romance que segue características parecidas com “Me chame pelo seu nome”, história que o popularizou no meio literário, ganhou uma adaptação cinematográfica e o Oscar. André volta a explorar a capacidade de um homem de se apaixonar loucamente e todas as idealizações e sofrimentos que um amor arrebatador pode causar. Tudo isso é feito com uma escrita poética, sincera e, por vezes sensual, que utiliza de elementos das artes e da cultura erudita. Em Variações enigma nos conectamos com Paul (ou Paolo) em fases diferentes da vida, onde o tom da história será sempre a forma pungente como ele lida com as relações amorosas.


A escrita de Aciman é algo que sempre me impressiona. Ela consegue ser poética e bruta ao mesmo tempo e em “Variações”, como se trata do fluxo de pensamentos do protagonista, a prosa de Aciman assume um caráter de discussão interna, bem nos moldes daquelas que temos com a gente mesmo. André Aciman sabe escrever lindamente sobre paixão e amor.

Ainda muito jovem, com apenas 12 anos e vivendo em um vilarejo no interior da Itália, Paolo se vê encantado por um marceneiro de vinte e poucos anos que aparece na casa de sua família para reformar um móvel antigo. Esse amor platônico servirá como um movimento de descoberta de uma das facetas da sexualidade de Paolo. O capítulo inicial, que para mim é um dos melhores do livro, já nos dará dicas interessantes de como funcionará a cabeça e os desejos do personagem na vida adulta.

- Sim, o passado é um país estrangeiro - falei -, mas alguns de nós são cidadãos de pleno direito, outros turistas ocasionais e outros itinerantes incertos, ansiosos por ir embora, mas sempre desejosos por voltar.
Para algumas pessoas, esse recorte do despertar da sexualidade e dos desejos de Paolo, ali pelo final da infância, pode gerar alguns incômodos. Particularmente, não vi problemas na forma como o autor explora o assunto. Aciman segue os passos de como se dá esse despertar de um sentimento que é algo muito novo e que surge ali, numa fase da vida onde a puberdade e os hormônios já estão ditando algumas regras. Fomos condicionados, culturalmente, a ignorar o florescer da sexualidade humana, que acontece muito mais cedo do que pensamos.

Os demais capítulos darão um salto no tempo e veremos Paolo como um jovem adulto, vivendo na cidade de Nova York e envolto em algumas tramas amorosas complicadas. É interessante a forma como Aciman constrói a personalidade de Paolo. Ele é um homem difícil de se decifrar, repleto de neuras e de atitudes que por vezes não entendemos muito bem. Exatamente por isso ele se torna um personagem bastante real.

As relações amorosas seguem sendo o calcanhar de Aquiles do personagem. Seja se relacionando com mulheres ou com homens, Paolo repete alguns ciclos de comportamentos que transforma as relações em tramas cheias de reviravoltas. Paolo parece não conseguir se firmar em um amor tranquilo e mesmo quando não há tensões ele acaba criando-as, ainda que seja apenas em sua mente. Ele parece se reconhecer enquanto sujeito quando envolto em caos.

O arrependimento é o modo como ansiamos por coisas que perdemos, mas nunca tivemos de verdade. O arrependimento é a esperança sem convicção, eu disse. Estamos divididos entre o arrependimento, que é o preço que pagamos pelas coisas que não fazemos, e o remorso, que é o preço que pagamos por fazê-las. Entre um e outro, o tempo se diverte com seus convidativos truques.
O livro é estruturado em cinco partes em uma escrita que se assemelha aos contos. Algo interessante é que cada um dos capítulos pode ser lido de forma aleatória e isso não irá interferir no entendimento da obra. Seguindo nessa ideia de aproximação dos contos, cada um dos capítulos possui uma espécie de ponto final, de conclusão, ainda que se tratem de episódios da vida amorosa de Paul. E cada um deles termina de forma inesperada, trazendo uma revelação difícil de se prever.