Escafandrista do roteirista e escritor Louraidan Larsen (2020) é um livro composto por pequenos textos que passeiam pelas características do conto e da crônica e nos faz mergulhar em histórias aparentemente comuns, mas que guardam em sua essência algumas reflexões sobre o que é ser e estar no mundo. Às vezes, levantamos o olhar para ver as estrelas, mas não percebemos o extraordinário e as diversas histórias que acontecem nas esquinas. Louraidan nos convida a olhar para o lado e brincando com a rotina, apresenta um livro que transforma o dia a dia em uma narrativa envolvente. O projeto gráfico feito pelo Estúdio Lampejo é impecável. Possui prefácio da cartunista Laerte Coutinho e ilustrações do Fernando Poletti.


Livros, músicas e demais expressões artísticas que dedicam um olhar atento ao considerado comum, simples ou banal sempre me chamam bastante atenção. Acho muito mais difícil demonstrar a beleza ou o extraordinário daquilo que desfila diante de nós o tempo todo e que, portanto, se torna invisível, do que a exaltação daquilo que é incomum ou fora da curva, onde a narração da sua própria imprevisibilidade já dita o tom.

Existe uma crônica da escritora Marina Colasanti, chamada “Pelo menos, por hoje” onde ela faz um exercício interessante de percepção daquilo que é comum. O texto em questão parte da rotina e da previsibilidade até de como organizamos os dias e as semanas, um após o outro, demonstrando que nem mesmo isso nos afasta do imprevisto que pode ocorrer no intervalo de segunda a segunda. O texto de Louraidan me remeteu a esse mesmo tipo de olhar atento ao que acontece desde que acordamos até a hora que fechamos os olhos para dormir novamente.

Lendo a obra de Louraidan é impossível não revisitarmos a nossa própria memória entre um conto e outro. Seja por identificação com alguma história similar que já tenha acontecido com a gente (ou que tenhamos presenciado), seja pelo simples fato de lembrarmos de algo que também daria um conto. A narrativa de Louraidan acontece na rua, no elevador, na padaria, no ônibus, no supermercado e até mesmo quando ela vai parar lá em Havana, é o mistério do cotidiano e o que se desenrola a nossa volta que continua no radar. Cada um dos espaços, são vistos pelos olhos curiosos de um escritor e sabemos que um escritor quando procura (e até mesmo quando não) acha.



Um outro ponto de identificação com a obra, principalmente para quem vive em Belo Horizonte, é que a cidade também acaba se tornando personagem nos textos. Louraidan passa por ruas e outros lugares muito familiares aos belorizontinos. Conseguimos perceber facilmente a dinâmica de como a cidade funciona.

A rua no centrão de Belo Horizonte estava cheia. A calçada, com muita gente vendendo, oferecendo coisas. Enquanto eu passava, percebi uma moça distribuindo folhetos. Como eu estava muito apressado, não consegui pegar nenhum. Logo entrei no local onde vou uma vez por mês para colocar crédito no meu cartão de ônibus.


O livro é dividido em três grandes atos intitulados “Conversas com pessoas desconhecidas”, “Histórias que ouço nas ruas” e “As surpresas da vida”. Assim como o olhar atento, a oralidade também exerce uma função fundamental na obra, pois ajuda a desenhar um panorama com diversas vozes, realidades e personagens que vivem a vida das mais diversas maneiras em uma narrativa que preza pelo respeito ao indivíduo e foge do juízo de valor.