Setembro negro, do escritor italiano Sandro Veronesi (Autêntica Contemporânea, 2025) é um romance de formação, onde acompanhamos os sentimentos e as descobertas do jovem Gigio Bellandi. Em pleno verão de 1972, na Versilia, noroeste da Toscana, na província de Lucca e com apenas 12 anos de idade, nosso narrador constrói uma teia de acontecimentos que entrelaçam a formação e o amadurecimento de Gigio com a cultura e os fatos políticos que fizeram desse ano um período singular.
O livro começa com um ritmo lento que obedece à necessidade do narrador de deixar muito bem demarcado de que lugar Gigio fala. Ele é apenas um garoto de férias e que está vivendo o rito de tratar cada descoberta da vida com a intensidade que os adolescentes o fazem. Gigio achou que aquele verão seria apenas mais um verão agradável como os demais, mas seria um verão que mudaria para sempre sua vida e de sua família.
O pulo do gato da obra, está na maneira como Gigio narra sua própria biografia. Ele vai montando uma colcha de retalhos, através de um passeio pelo tempo e pelas suas próprias memórias. Nesse ponto, Veronesi utiliza das diversas possibilidades que um autor possui em mãos através da exploração da memória. Toda a narrativa é construída com aquilo que Gigio se lembre, mas também com aquilo que pode ser uma mera projeção de um homem adulto tentando se reconectar com quem era aos 12 anos de idade.
Faço bem em recordar, em reconstruir. Quanto mais o faço, mais consigo ver o menino que eu era, e vê-lo vale muito mais que sabê-lo, para mim, que estou tentando dizê-lo.
Para começar a contar esta história, preciso falar dos meus pais. Naquela época, eles eram os guardiões da minha serenidade, e isso significa que eram bons pais.
Os capítulos iniciais do livro se dedicam a nos mostrar quem é o garoto Gigio e sua família, que é composta por ele, sua irmã e seus pais. É onde também acompanhamos o florescer de seus desejos, através do encantamento da primeira paixão. Ao lado de Astel, Gigio vive diversas emoções característica da sua idade, que são entremeadas de muita música e literatura. Seu tio Gigio, também é uma figura que nos ajuda a ambientar na narrativa. Ele é um exemplo de como algumas figuras afetivas podem se tornar um marco de nossa infância e servirem como um farol, um ponto de encontro que separa nossas vidas em eras diferentes.
Se até aqui contei todas essas pequenas coisas, não é porque as considere importantes em si – sei muito bem que não são -, mas para que vocês se deem conta de quem eu era naquela época e do que era composta minha vida, no auge da minha infância, ou melhor, um pouco mais além, aos doze anos, no verão de 1972; e, assim procedendo, esforçando-me para recordá-lo e narrá-las a vocês, também me dou conta disso.
Sandro Veronesi escreve de forma magistral, e durante toda a obra, evoca sensações e interpretações sobre o contexto da obra, através da exploração de cores, sons, cheiros e imagens de uma infância bem vivida e que não volta mais. A obra explora as memórias de Gigio e cresce ainda mais ao demonstrar a força das memórias coletivas.
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