A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão do escritor chileno Luis Sepúlveda e do ilustrador japonês Satoshi Kitamura (Baião, 2023) é um ótimo exemplo de como a literatura para as infâncias possui a capacidade de despertar nos jovens leitores, de forma magistral, a percepção da literatura enquanto arte. O texto de Sepúlveda é certeiro no que se refere à construção de uma obra atenta à experimentação do texto literário e que convida os leitores para discussões importantes sobre identidade, personalidade e nosso papel no mundo.
Os caracóis do País do Dente-de-Leão levam uma vida lenta, pacífica e silenciosa, a salvo dos predadores e de outros riscos. Um deles, porém, insiste em ter um nome e descobrir quais são os motivos da sua lentidão. Para isso, ele parte numa viagem de autodescoberta, onde se depara com uma ameaça que coloca a vida de todos em perigo.
O livro já nos encanta desde o seu texto de apresentação. O autor conta que a inspiração surgiu após o seu neto Daniel, que observava um caracol no jardim, surgir com a seguinte pergunta: porque o caracol é tão lento? Através dessa indagação de uma criança, que também nos mostra o quanto nosso olhar vai se viciando perante as pequenas e grandes curiosidades da vida, Sepúlveda sentou para escrever um livro sobre esse caracol que queria saber o porque dele mesmo e seus semelhantes serem naturalmente lentos.
O personagem passa a olhar atentamente para as características de outros animais, a fim de entender de onde vem essas diferenças e se somos assim tão diferentes, qual seria a funcionalidade disso? Quem ou o que determina qual o nosso papel no mundo? Porque somos feitos assim ou assado? Como uma criança em fase de experimentação, vamos viajando por um descampado, enquanto perguntas fundamentais vão sendo respondidas através de ponto de vistas de vivências completamente diferentes.
Eles sabiam que eram lentos e silenciosos, muito lentos e muito silenciosos, e também sabiam que a lentidão e o silêncio os tornavam vulneráveis, muito mais vulneráveis que outros animais capazes de se mover com rapidez e fazer voz de alerta. Para não terem medo por conta de sua lentidão e escassa capacidade de fazer barulho, preferiam não falar disso, e aceitavam ser como eram, com lenta e silenciosa resignação.
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