Os invisíveis de Tino Freitas e Odilon Moraes (Companhia das Letrinhas, 2021) é mais um exemplo de que algumas literaturas para as infâncias precisam ser lidas em qualquer idade. “Era uma vez um menino com um superpoder: na sua família só ele via os invisíveis”. Esse “era uma vez” é a porta de entrada para uma história que trata de diversos temas importantes, como a curiosidade genuína das crianças, em contraponto com a nossa predisposição (voluntária e involuntária) ao apagamento das vivências infantis. Carrega também um forte apelo social sobre o nosso olhar para o mundo e as pessoas que nos rodeiam.


O texto sensível de Tino, com o traço genial de Odilon, que apostou na caneta Bic preta para as ilustrações, compuseram uma obra que pede várias leituras. O menino da história olha para o mundo com olhos de quem quer ver. Já na ilustração de abertura vemos ele vestir uma capa de herói e o simples exercício do olhar é colocado como um superpoder.

No decorrer da história, o menino passa por um gari e o olha com curiosidade. Passa por um idoso sentado em um banco de praça e o observa com igual atenção. Aproxima de dois personagens que parecem estar em situação de rua e se agacha para conversar. Em todas as cenas, Odilon Moraes retrata as personagens invisibilizadas pelo modelo de sociedade que vivemos hoje, com corpo e sem cabeça. Isso causa um impacto visual importante para a narrativa.

Na sequência, o livro mostra como as vezes, o próprio garoto, nas vivências do dia a dia com a família, também se sente invisível. Então ele mesmo aparece representado sem cabeça, enquanto seus pais estão imersos em outras atividades. Isso nos faz refletir sobre que voz e que escuta dedicamos às crianças, sendo que o peso da rotina e das obrigações acabam roubando as oportunidades de interação.


O tempo vai passando e o livro passeia pelo ciclo da vida. O menino vai para a faculdade, consegue um emprego, se apaixona, vê a família diminuir e também aumentar, até que ele se esquece do poder que tinha. Aquele poder de se relacionar de forma diferente com o mundo que só as crianças conseguem.