O muro de Céline Fraipont e Pierre Bailly (Editora Nemo, 2018) é um quadrinho que nos coloca como principais companhias de Rosie, uma menina de apenas 13 anos que vive numa cidadezinha do interior belga, em meados de 1988. Como se não bastasse toda a efervescência e intensidade da adolescência, Rosie também está enfrentando o processo de quebra da sua noção de lar com a separação dos pais. Enquanto vive sua melancolia, Rosie irá acessar um outro mundo, onde cabem as descobertas típicas da adolescência, mas também os perigos de uma mente procurando escapes emocionais.


A arte do quadrinho é meio soturna. Parece ser sempre noite. Os capítulos são intercalados por uma página toda preta que nos coloca muito próximos da melancolia que Rosie sente. Ela procura conforto em uma amiga em especial, como também na bebida e na música. O quadrinho é todo permeado de referências a bandas clássicas de punk rock.

Todos os trechos em que Rosie expõe suas ansiedades são bem fortes e mostram alguns estágios de um quadro depressivo. “Sei que é besta, mas, às vezes, brinco de me esconder por um tempão, não sei muito bem por quê. Tá bom, devo estar louca mesmo. De qualquer jeito, não contei pra ninguém. Tomo vários banhos quentes por dia. O calor no banheiro é como um ninhozinho de conforto. Às vezes, fico horas no banho. Se minha mãe soubesse!”

Algo um tanto revoltante na história é que vemos Rosie abandonada à própria sorte. Sua mãe se apaixonou por um outro homem e simplesmente decidiu ir embora para viver a paixão em outro país. Seu pai, amargurado e revoltado com o abandono da esposa, mergulhou na rotina de trabalho e passa dias sem aparecer em casa. Com isso, Rosie se vê sozinha com a própria dor e estar sozinha aos 13 anos, sem apoio emocional, pode levar uma adolescente para caminhos tortuosos.


“O muro” é um livro que trata de maneira franca e sensível sobre o rito de passagem, sobre o amadurecimento. Por mais que Rosie se sinta abandonada e esteja vivendo um caso grave de negligência parental, todo o tempo ela demonstra conhecer os seus limites e todos os seus atos “fora da curva” são realizados como uma forma de buscar pertencimento ou de desafiar uma realidade que não é nada amigável com ela.

No fim das contas, o muro aparece como uma representação tanto daquilo que nos fecha e que nos limita, como daquilo que pode ser descortinado e mostrar uma nova perspectiva, quando ousamos escalar a parede. Um muro pode ser um ponto de estagnação e também uma forma de ver mais alto.