O soldado que não era do Joel Rufino dos Santos (Editora Moderna, 2003) transforma em texto literário a história real de uma mulher que decidiu lutar pela independência do Brasil. Maria Quitéria de Jesus Medeiros, ao perceber que partidários da Independência do país estavam passando pela Comarca de Nossa Senhora do Rosário em busca de voluntários e de doações, logo pediu permissão ao pai para se alistar. Com sua negativa ela se disfarçou de homem e a partir daí foi se destacando no regimento por conta de sua bravura.


A narrativa do livro é voltada para o público jovem e apresenta de forma bastante envolvente uma história quase que esquecida do povo brasileiro. Joel Rufino se vale de um texto com ares de aventura para nos apresentar a Maria Quitéria, mas deixa nítido que se trata não apenas de uma história fascinante de luta, como também de um capítulo importante da história do Brasil.

Sobre a escrita e a construção das personagens, Rufino avisa aos leitores: “Elas não disseram, necessariamente, aquilo que eu as fiz dizer. Não importa. Como não sabemos exatamente o que disseram, podemos imaginar. Qualquer um tem esse direito”.

Como apenas homens podiam fazer parte do exército, Maria Quitéria usurpou o nome de seu cunhado e passou a ser conhecida como soldado Medeiros. Após ter sua identidade descoberta, o que levou apenas algumas semanas, o próprio Major Silva e Castro permitiu que ela continuasse em seu posto em reconhecimento a sua coragem, pois sua bravura gerou bons resultados na luta contra os portugueses. Assim, Maria Quitéria foi a primeira mulher a fazer parte do Exército Brasileiro e abriu caminhos para que um grupo de mulheres entrasse em batalha. Ela participou de vários combates com o batalhão, entre os quais estiveram a defesa da Ilha da Maré, da Barra do Paraguaçu, de Itapuã e da Pituba.


Enquanto nos conta a história de Maria Quitéria, Joel Rufino também nos diz sobre um tempo que foi definidor para a história do nosso país e que descreve o clima daquela época em que o Brasil estava farto de ser explorado como colônia.

Seis horas da tarde, quando os morcegos começavam a dar cabeçadas nos lampiões, os portugueses botavam trancas nas portas. Tinham medo de tudo: de serem atacados a varapaus; de serem assaltados; dos xingamentos e das cusparadas. Mas morriam de medo principalmente de uma coisa: dos despachos que os negros armavam pelas esquinas.

O Brasil começava a lutar não só com suas armas de fogo, mas também munido de sua sede de libertação que se manifestava na cultura e nas crenças. Ao escrever um livro que nos faz olhar para um passado escrito por mãos e com sangue femininos, temos a oportunidade de ler sobre uma reparação histórica, sobre uma história que nomeia aqueles que foram fundamentais para libertação do país, uma vez que é só olhando para trás que vamos conseguir construir um futuro que sabe analisar quem éramos, que entende quem somos, para vislumbrar o que ainda podemos nos tornar.