Arlindo, quadrinho escrito e ilustrado pela Luiza de Souza, Ilustralu (Editora Seguinte, 2022) carrega importantes discussões sobre amor, amizade, família, sexualidade, identidade e diversas questões dentro do contexto da adolescência. Acompanhamos a rotina do jovem Arlindo, um menino sensível e sonhador, que assim como a maioria dos meninos gays, precisa lidar com a própria sexualidade muito antes de estar pensando sobre isso. A homofobia é tão cruel que ela se antecipa ao próprio processo de descoberta que deveria ser individual e que passa a ser de domínio público à medida que qualquer sinal considerado “fora da norma” seja detectado. 


A Ilustralu conseguiu criar uma história que causa bastante identificação nos leitores por diversos motivos. O primeiro deles se refere a forma leve, bonita e responsável com que trata da diversidade sexual. É uma história que não deixa de falar sobre as micro e macro violências vividas pela comunidade LGBTQIA+ e aproveita para a partir delas, falar sobre a força de se entender enquanto sujeito para a formulação da própria identidade e da própria individualidade. Existem alguns trechos que batem forte, principalmente para quem precisa o tempo inteiro justificar a própria existência.

Assim como Heartstopper, o quadrinho se coloca em um lugar de tratamento da temática da diversidade, da descoberta enquanto LGBT, do namoro e da paixão adolescente através de um olhar mais positivo e humano. A gente torce muito pelo Arlindo e seus amigos. O ótimo texto da Luiza, junto à exploração de uma ilustração que aposta no amarelo, rosa e preto vívidos, prendem nosso olhar na página e é difícil deslocar a atenção daquelas cores tão vibrantes dando vida a um traço muito divertido.


Um outro motivo que vale exaltação é a ambientação da história. Arlindo vive numa pequena cidade do interior do Rio Grande do Norte. Então vemos desenrolar a nossa frente uma história brasileira até os ossos. É divertida a forma como a Luiza utiliza de muitas características que ajudam a demarcar muito bem a brasilidade da história e vai ainda mais fundo ao utilizar de alguns termos ou jargões típicos de quem é do norte. Acho sempre válida a popularização de histórias que fogem do eixo do Sudeste, mostrando que o Brasil é muito mais rico e diverso do que nos é oferecido para consumo nas grandes livrarias.

Luiza usa e abusa também das referências do final dos anos 90 e início dos anos 2000. Essa ideia foi uma das mais felizes na minha opinião. Seja no cantinho de uma estante do quarto de Arlindo, numa música que está tocando, num filme que estão escolhendo na locadora (que não pode esquecer de rebobinar), nas próprias vestimentas e referências da cultura pop, vemos uma homenagem a um período recente, mas que já deixa aquela nostalgia para quem foi adolescente nos anos 2000. Arlindo se diverte e sofre ao som de Sandy e Júnior e Pitty, os personagens trocam mensagens através do saudoso msn, leem as revistinhas da Turma da Mônica, entre outras referências que acaba se tornando divertido procurar, pois muitas delas aparecem de forma muito sutil nas ilustrações.


Para além de tudo temos a personalidade cativante de Arlindo. Tanto a descrição do personagem, quanto o traço escolhido para representa-lo fazem com que o leitor já se identifique muito rápido com o garoto. Arlindo é muito especial e assim como milhares de garotos só gostaria de ter a oportunidade de viver as habituais etapas da vida. A sua trajetória é atravessada pelo preconceito e pela homofobia, mas também fortificada pela sua capacidade de buscar seu lugar no mundo e de poder contar com uma importante rede de apoio no âmbito das amizades, da escola e da comunidade em que vive. Arlindo é um quadrinho mais do que indicado para todas as idades.