O pequeno príncipe em cordel de Olegário Alfredo (Penninha Edições, 2020) é um livro onde o Mestre Gaio faz uma releitura da clássica obra de Antoine de Saint-Exupéry. Escrita originalmente na década de 1940, aqui ela ganha uma roupagem que a transporta para a literatura de cordel, um gênero literário que casou perfeitamente com nossa cultura e se tornou com o tempo parte de nossa identidade nacional. Como histórias clássicas não morrem, e inclusive, vão se ressignificando através dos tempos, Olegário e o ilustrador Santiago Régis fazem um convite ao leitor para redescobrimento dessa obra francesa e para se pensar a história em um contexto bem abrasileirado. Como seria se, em vez do deserto do Saara, o piloto narrador encontrasse o Pequeno Príncipe no sertão nordestino? 


É sobre o Pequeno Príncipe
O enredo deste cordel
De Antoine Saint-Exupéry
Um piloto menestrel 
Um livro pra reflexão
A expressar o seu papel.

Sonhava ser desenhista
Mas foi desencorajado
Estas coisas de adulto
De podar o iniciado
Seu desenho de jiboia 
O deixou meio frustrado.

O seu primeiro desenho
Um elefante engolido
Por uma cobra jiboia 
E ninguém lhe deu sentido
O adulto principalmente
O deixou bem reprimido. 

O trabalho realizado nesta nova edição é muito bem explicado por um dos textos de apoio que exemplificam a obra como "uma famosa receita estrangeira preparada com ingredientes brasileiros." e a mistura culminou num sabor muito especial. O ilustrador Santiago Régis fez uma imersão muito criativa e sensível ao olhar para a cultura popular e encontrou a inspiração necessária na tradicional cultura nordestina, que foi uma das regiões que fizeram com que a literatura de cordel encontrasse seu jeito brasileiro de contar histórias. Existe ainda um cuidado com a manutenção de elementos clássicos da obra original de Exupéry, mas sem perder a liberdade de explorar outras maneiras de interpretar imageticamente o universo de "O pequeno príncipe". 

Nas ilustrações vamos encontrar o cenário da caatinga como pano de fundo, a utilização de animais da nossa fauna, como a raposa que foi substituída por um lobo-guará, a serpente que virou uma cobra coral, referências à técnica de xilogravura, além de uma divertida brincadeira com os personagens que vão trazer elementos simbólicos do carnaval pernambucano.  


Santiago Régis representou o Rei do Planetinha Um como um rei do maracatu. A ilustração já nos diz muito sobre a imponência de um personagem do maracatu para representação da figura de um rei, além de ser uma bela homenagem a nossa cultura e à maior festa de rua do mundo. É digno de nota que especula-se que o início do maracatu pode ter se dado por volta de 1711 em Pernambuco o que demostra sua resistência e importância para a cultura brasileira. 


O Rei do segundo planeta aparece com uma bela fantasia de papangu, outro famoso personagem do carnaval pernambucano. Os papangus são figuras que fazem parte do imaginário coletivo pernambucano, é alvo de diversos estudos sobre cultura popular e a confecção de suas máscaras obedecem a toda uma técnica especial da cidade de Bezerros. 


O rei do quinto planetinha visitado pelo Pequeno príncipe divertidamente virou um acendedor de lampião, vestido de lampião no ato de acender um lampião. 

Quando um livro entra em domínio público, como é o caso de "O pequeno príncipe" é comum que as editoras lancem novidades do mesmo universo que o livro. A obra passa a ser explorada de diversas maneiras e o diferencial de "O pequeno príncipe em cordel" é justamente essa ideia de trazer uma abordagem que brinca com o texto original, que o trás mais para perto de nós brasileiros em um trabalho de edição que não menospreza a inteligência e o bom gosto do leitor. "O pequeno príncipe em cordel" nos entrega uma obra para divertimento e também para fruição, pois garante algumas horas de viagem por imagens que despertam nosso olhar para a beleza e deixa aquele gostinho de pesquisar sobre os elementos que são explorados.