A irmã da lua: a história de Tiggy da Lucinda Riley (Editora Arqueiro, 2018) é o quinto volume da série “As Sete Irmãs”. Após conhecermos as histórias de Maia, Ally, Estrela e Ceci, embarcamos na história da família de origem de Tiggy e os acontecimentos que levaram à separação. Para contar sua história Lucinda nos leva a uma viagem que passa por diversos países e principalmente pela Espanha, onde nos aproximamos de elementos da cultura gitana e somos embalados pelo ritmo viciante do flamenco. Por se tratar de uma história sobre os ciganos é impossível não passar por temáticas como fé, tradição, preconceito e sobrevivência.


Tiggy D'Aplièse tem uma personalidade peculiar. De todas as irmãs é a que mais se conecta com as questões de espiritualidade, quase como se tivesse um terceiro olho. Ela leva essas características também para seu trabalho. Tiggy é apaixonada pela natureza e tem um especial apreço pelos animais. Atua como especialista da vida selvagem e quando é contratada por uma grande propriedade da Escócia para acompanhar o processo de adaptação de um grupo de gatos selvagens, se aproxima de pessoas que irão mudar para sempre sua vida, principalmente o velho cigano chamado Chilly, que guiará sua mente para um século antes e seus passos para as grutas de Sacromonte na Espanha.

Seguindo algumas pistas deixadas por seu pai adotivo, Tiggy descobre que possui algum tipo de parentesco com Lucía Albaycin, também conhecida como “La candela”, uma famosa dançarina de flamenco. Os capítulos onde a história se dedica a contar toda a jornada de Lucía até o estrelato são os mais emocionantes da obra, tanto pela personalidade forte de Lucía, como pela forma como Lucinda aborda a paixão dos gitanos pelo flamenco.



Lucía começa a ficar conhecida ainda criança, quando seu pai, ciente de seu talento para a arte do flamenco, a insere clandestinamente em um concurso só para adultos. Assim, como nos demais volumes da série, que Lucinda mescla acontecimentos reais e históricos com ficção, a autora utilizou de um evento real para iniciar a saga das personagens. Em 1922, o compositor de flamenco Manuel de Falla organizou uma competição em Granada para encontrar novos talentos chamada de El Concurso de Cante Jondo (O Concurso do Canto Profundo), que aconteceu na famosa Alhambra.

The Alhambra, em Granada, Espanha. Gravura antiga por volta de 1890

Entre os vários elementos reais da história, temos a própria ambientação. Gerações da família de Tiggy viveram e morreram na região de Sacromonte, onde os gitanos moravam em grutas, formando uma grande comunidade que precisava viver a margem da sociedade por conta de um preconceito histórico. Os árabes da Espanha descobriram que era fácil escavar a pedra macia da montanha sagrada de Sacromonte. Construíram grutas, que depois se tornariam casas para aqueles que haviam sido expulsos da cidade de Granada. Esse processo de exclusão foi vivenciado não apenas pelos gitanos, mas também pelos judeus e muçulmanos.

Para a construção da personalidade de Lucía Albaycin, Lucinda revisitou a história de um grande nome do flamenco, Carmem Amaya. A artista nasceu em 1913, em Barcelona, em uma família cigana pobre. Como a personagem de Lucinda também nasceu nas Sete Cavernas Sagradas de Sacromonte. Várias outras características de Carmem Amaya foram inseridas na personagem de Lucía, como a baixa estatura, a dedicação em levar sua dança para vários continentes e ser reconhecida, a ambição em se tornar maior que a dançarina La Argentinita (também real) que havia conquistado a América, o relacionamento romântico com um dos integrantes de seu cuadro e a coragem de ser a primeira dançarina de flamenco a utilizar calças, vestimenta que só era permitida aos dançarinos homens.

Carmem Amaya

A irmã da lua além de perpassar toda uma geração de uma família, acaba também contando várias histórias em uma, pois a narrativa viaja de um século a outro fazendo um resgate histórico que justifica o presente de cada um dos personagens. Viajamos entre passado e presente em mais um capítulo dessa grande saga familiar de Lucinda Riley que nos emociona ao demonstrar a força da ancestralidade e das histórias.